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Ospreys Tunados, o Resgate do Fuzileiro Ryan e o Apocalipse Digital

12 anos e meio atrás

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Em Junho do ano passado um helicóptero levando um grupo de 32 fuzileiros de forças especiais sofreu uma pane durante uma tempestade de areia no Afeganistão. Fizeram um pouso forçado perto de Kunduz, que é a forma abreviada do nome da região, Kunduz do Mundo.

Pra piorar era uma chamada “Zona de Pouso Quente”, o que significava que estavam cercados de talibãs atirando com AK-47s e morteiros. A base mais próxima ficava a 650Km de distância. O helicóptero mais rápido do mundo fora o Águia de Fogo é o Sikorsky X2, um modelo experimental que atinge 400Km/h. Mesmo que estivesse disponível não tem espaço para levar 32 pessoas.

Um helicóptero como o Blackhawk tem capacidade para transportar bastante gente, mas só consegue atingir 295Km/h. Mesmo que fosse mais rápido teria que fazer uma trajetória tortuosa entre as montanhas que separavam a base dos fuzileiros, que viam o tempo e a munição se esgotando.

 

O único veículo capaz de salvá-los era a aeronave que conseguiu derrotar até os Decepticons, o Bell Boeing V-22 Osprey. Controverso, cheio de problemas e quase cancelado a idéia ousada de uma aeronave híbrida, capaz de pairar como um helicóptero e voar como um avião é o melhor de dois mundos, eliminando a necessidade de uma pista de pouso sem abrir mão de velocidade e capacidade de carga.

Dois Ospreys decolaram da base aérea, subiram acima da altitude da cadeia de montanhas e voaram ao resgate, direto em linha reta a 565Km/h, máxima velocidade que seus motores Rolls-Royce de 4.590Kw são capazes de atingir.

Os fuzileiros foram resgatados, sem nenhuma baixa.

O resgate hoje poderia ter sido um pouco mais rápido. Não que haja uma aeronave melhor, o Osprey foi melhorado. Como? Software. O último upgrade deu ao Osprey mais 37Km/h de velocidade e mais 453Kg de capacidade de carga em modo pairando.

Isso foi resultado de seis semanas de testes, quando compararam a performance do Osprey com os modelos usados nos softwares de controle de vôo, motores, etc. Alinhando dados reais com valores simulados é possível identificar pontos de desvio, gargalos no processamento e oportunidades de otimização.

Antigamente isso significava voltar para a prancheta e levar meses projetando peças novas.

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cockpit do F-35. mais digital impossível.

No mercado automobilístico essa prática já existe faz tempo, para desespero das montadoras hackers do bem criam softwares que modificam o firmware dos computadores de bordo, otimizando performance e tornando selvagens carros bem-comportados.

Não chega a ser o mesmo caso, claro, pois os carros são artificialmente limitados, muitas vezes por motivos Legais, então ao liberar a velocidade máxima você está apenas cancelando uma barreira. No Osprey o software foi projetado para tirar o máximo do hardware, mas como TODO programador sabe, isso é algo que leva tempo, ninguém nasce com expertise para escrever de primeira o MELHOR algoritmo possível.

Um F-22 é controlado por 1,7 milhões de linhas de programação. O F-35 roda (digo, voa) com 5,7 milhões de linhas. O Boeing 787 Dreamliner, 6,5 milhões. O kernel 2.6.0 do Linux tem 5,9 milhões de linhas.

PARECE muita coisa (e é!) mas se compararmos um carro topo de linha tem, somados todos os microcontroladores, sistemas auxiliares e sensores, por volta de 100 milhões de linhas de código. Dependendo do modelo o custo do software chega a 40% do preço do carro.

Hoje TUDO é software, da sua televisão ao acelerador da Uno Electronic, um dos primeiros usos populares de drive-by-wire. Só que o mesmo software que permite um upgrade no Osprey faz com que a Toyota seja obrigada a fazer um recall de 160 mil carros, que por causa de um bug estavam simplesmente DESLIGANDO do nada. Estimativa de custo do upgrade nas oficinas? 240 mil homens/hora.

Falhas inesperadas em software causam problemas como o acidente da TAM em Congonhas, quando o sistema de controle se confundiu com informações contraditórias, sem entender se o piloto queria pousar ou arremeter – ou o caso da Air France, cujo sistema de sensores falhou e o avião não apelou para meios alternativos para determinar sua atitude e velocidade. Essas falhas causam tragédias, felizmente raras, mas quando até a chave do seu carro depende de software, as chances de algo dar errado crescem geometricamente.

A necessidade de lançar novos produtos todo dia no mercado, sem tempo de testar e blindar contra erros, falhas e invasões cria terreno para verdadeiras epidemias, “naturais” ou artificiais. Isso tende a persistir, até uma empresa grande fechar as portas quando seu principal produto deixar TODOS os consumidores na mão.

E se você acha que estou exagerando, lembro que no começo do ano um grupo de pesquisadores de segurança pwnou o computador central de um carro. Como? Colocando no CD Player um disco com um cavalo de tróia. O CD leu, entendeu como atualização de firmware, instalou o programa maligno e dali se comunicou via bus de dados com o computador central, assumindo o controle.

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