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Hellblade: Senua's Sacrifice — Review

Com uma narrativa espetacular, gráficos lindos e abordando um tema tão delicado como a psicose, Hellblade: Senua's Sacrifice é um daqueles títulos que nos dão orgulho por sermos apaixonados por games. Leia nossa análise.

6 anos e meio atrás

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Uma das características comuns a boa parte dos jogos eletrônicos são os protagonista superpoderosos. Ao criar personagens para suas obras, os autores de games costumam aproveitar a mídia para nos colocar no controle de pessoas praticamente sem defeitos, heróis que mesmo parecendo frágeis no início, sabemos que evoluirão até se tornarem seres que se aproximarão da onipotência. Já no caso do Hellblade: Senua's Sacrifice, o pessoal da Ninja Theory queria seguir por outro caminho.

Bebendo das mitologias celta e viking, o estúdio britânico criou a personagem que empresta seu nome ao título e de forma surpreendente recorreu a algo tão interessante quanto arriscado para torná-la mais humana: fazer com que Senua sofresse de psicose. Isso poderia ser encarado por alguns como uma estratégia barata para chamar a atenção, mas bastará alguns poucos minutos dentro do jogo para percebermos que a ideia foi brilhante.

hellblade-senuas-sacrifice-5Para entender como os problemas psicológicos da protagonista se encaixam no enredo (e até na jogabilidade), primeiro precisamos falar sobre o seu passado. Nascida numa aldeia celta que foi isolada das demais pelos romanos, Senua aos poucos começou a ter visões e a ouvir vozes. Para os que conviviam com ela, aqueles eram sinais de poderes sobrenaturais, fazendo com que a garota se isolasse numa floresta. Com o tempo o exílio chegou ao fim, mas quando ela voltou para casa descobriu que o amor da sua vida tinha sido cruelmente assassinado por invasores vikings.

Em busca de vingança e planejando trazer o amado de volta à vida, Senua parte em uma perigosíssima viagem rumo ao inferno nórdico, onde pretende enfrentar a deusa Hela e assim conseguir se redimir. Durante o caminho ainda conheceremos um pouco da mitologia viking, mas o que já seria uma tarefa quase impossível se torna muito mais complicada devido aos problemas mentais da guerreira. E é aí que o Hellblade se destaca.

Sabendo que estavam lidando com um assunto que mesmo hoje em dia é bastante delicado e pouco conhecido, os membros da Ninja Theory recorreram a neurocientistas e pessoas diagnosticadas com psicose para tentar representar da melhor maneira possível os efeitos da doença. Isso os levou a um longo estudo e muitos testes, com o resultado sendo um dos jogos mais perturbadores que já tive tive contato.

Grande parte do sofrimento que somos submetidos a encarar junto com a protagonista vem das vozes que ela houve constantemente. Usando uma técnica conhecida como som bineural, onde os efeitos nos dão a impressão de estarem vindo de várias direções, é angustiante a maneira como as vozes tentam interferir nas ações de Senua, ora dando dicas valiosas, ora tentando desencorajá-la. Com uma execução tão brilhante, o conflito psicológico vivido pela personagem acaba nos afetando, mas para que isso aconteça é obrigatório jogarmos com fones de ouvido.

O jogo também brilha ao nos apresentar diversas alucinações visuais, umas mais sutis — e que não percebi inicialmente — e outras bastante explicitais, chegando até a momentos em que Senua parece se desligar do mundo a sua volta. Aliás, o Hellblade: Senua's Sacrifice também flerta com a representação da depressão, problema que pode estar diretamente relacionado à psicose e que obviamente era ainda menos compreendido há alguns séculos.

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No entanto, apesar de todo o primor técnico na parte sonora e visual (com uma das capturas de movimentos mais incríveis que já vi), o jogo não pode ser considerado impecável quando se trata de sua jogabilidade. O principal defeito do Hellblade está nas suas batalhas, que embora consigam entregar um nível de desafio bem elevado, são muito simples e repetitivas. Isso se deve desde a pouca variedade de inimigos até os movimentos, fazendo com que cada combate pareça apenas uma mera repetição dos anteriores.

Também pode desagradar um pouco os quebra-cabeças com os quais nos depararemos de tempos em tempos. No geral eles apenas exigirão que encontremos certos padrões nos cenários e se durante a aventura eu não consegui entender muito bem como eles se encaixavam no enredo, depois tudo passou a fazer mais sentido. Ainda assim, o desafio proposto por eles será bem baixo.

Ou seja, Hellblade: Senua's Sacrifice é mais um daqueles casos de jogo que peca em alguns aspectos, mas que acerta muito por oferecer uma narrativa espetacular e por usar as próprias características da mídia para incrementar a história. Se pensarmos nele apenas como um game, talvez não se trate de um muito acima da média, mas ao olharmos para a criação da Ninja Theory como a experiência como um todo que ela se propõe a oferecer, aí estamos falando de uma das obras mais sensacionais dos últimos tempos.

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Podendo ser considerado uma bela alegoria para tratar de um assunto tão complexo e que atormenta milhões de pessoas em todo o mundo, eu comecei a jogar o Hellblade: Senua's Sacrifice achando que encontraria nele apenas um bom game, mas acabei recebendo mais uma confirmação de que se os games não podem ser considerados arte, acho que muitas outras formas de expressão também não deveriam ser.

PS: após terminar a campanha do Hellblade: Senua's Sacrifice, não deixe de assistir o documentário que a Ninja Theory fez sobre o processo de criação do jogo. Nele entenderemos melhor muitos do elementos utilizados pela equipe e se ao subir dos créditos eu já havia achado o título muito excelente, após ver esse material passei a respeitá-lo muito mais.


Ninja Theory — Hellblade: Senua's Sacrifice | Official Trailer | PS4 & PC

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