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Como Einstein estragou a Copa do Mundo

Antigamente todo mundo torcia junto, aí veio um nerd alemão que não gostava de esportes, decidiu que a velocidade da luz era finita, e por causa dele hoje vivemos uma confusão: cada vizinho grita gol em um momento diferente. Mais que a Globo dessa vez a culpa do chato lá do apto 503 spoilear todos os jogos é de Einstein.

10 anos atrás

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Imagem descaradamente kibada do ceticismo.net

Nos velhos tempos era a pátria de chuteiras, o país unido, os olhos no infinito, o radinho na orelha, a outra mão no coração. Milhões prendiam a respiração, Pelé driblando lindamente, Carlos Alberto recebendo e armando o passe, o locutor tentando acompanhar a bola nos pés de Rivelino e sua Patada Atômica. Mais rápido que a esperança, era GOL DO BRASIL! Todos juntos gritavam, em casas, janelas, prédios, ruas. GOL, GOL, GOL.

(sobe Nelson Rodrigues. Ehê. Pronto)

Quando todo mundo acompanhava os jogos pelo rádio, e depois pela TV ninguém tinha noção de uma deficiência básica do Universo, determinada por Einstein: a finitude da velocidade da luz. Mesmo sendo a segunda coisa mais rápida do Universo, só perdendo pras Más Notícias, a Luz não se desloca em velocidade infinita.

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Desconsiderando atrasos em processamento, um gol no Maracanã sendo enviado para o transmissor da Rádio no Sumaré, e de lá recebido na minha casa percorre 18,5 km; significa que saberei do gol 61 microssegundos depois que ele ocorreu. Como meu tempo de reação não é muito bom, acabarei comemorando quase no mesmo momento em que um torcedor no estádio ou alguém a 50 km de distância, 166 microssegundos depois, uma eternidade.

Ou seja: se todo mundo ouvir pelo rádio, não importa onde você esteja na cidade, para todos os fins práticos percebe-se o jogo ao mesmo tempo.

No caso da TV o trajeto é o mesmo. O sinal vem do estádio, via link de microondas, passa pela emissora e é transmitido das antenas do Sumaré. Jogos em outras cidades são recebidos via satélite e retransmitidos pelas antenas locais. O atraso é o mesmo pra todo mundo.

Aí veio a TV a cabo e melou tudo.

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Um jogo no Maracanã pode ser acompanhado via rádio, TV local, TV por assinatura via cabo, TV por assinatura via satélite ou streaming via internet. Cada um tem um tempo de transmissão diferente.

Pior: uma emissora a cabo pode escolher usar como fonte de sinal a transmissão via satélite. E se seu link for de fibra óptica, pior. A velocidade da luz no vidro é de 200 mil km/s. Quase 1/3 abaixo da velocidade no ar. Yes, crianças, fibra é “lenta”.

O processo é mais ou menos assim: no estádio a imagem gerada vai para um caminhão que tem um link com um satélite geoestacionário na Órbita de Clarke, a 36.500 km de altitude.  Esse satélite envia o sinal de volta, captado na sede da emissora. Lá o sinal é processado e enviado para a antena local E para outro satélite. SE esse sinal tiver sido vendido para uma operadora de TV por assinatura tipo SKY, será captado, tratado e enviado para OUTRO satélite. Esse satélite, que é o que sua antena da SKY está mirando, transmitirá a imagem final que você capta.

Vamos a um caso ideal, onde só exista o link estádio-satélite-emissora-satélite-casa. São 4 pernas de 36.500 km. São 146 mil km. De cara, perdemos meio segundo. Some a isso o atraso de processamento do sinal e você está vários segundos defasado.

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Durante Portugal × Alemanha a transmissão via TV Digital no Lumia 630 estava 3 segundos defasada em relação ao jogo na SKY, ambas sintonizadas na Globo. 3 segundos dá tempo de mostrar um exoesqueleto.

Se sua TV é por cabo digital, ainda tem todo o processo de codificar e comprimir o sinal, MAIS o processo de descomprimir.

Se você assiste via streaming, a própria rota dos pacotes TCP/IP irá afetar o tempo de atraso das imagens. Seu provedor não necessariamente fará o mesmo caminho que outro.

Einstein é implacável. Tempo é relativo, nossa percepção não está preparada para lidar com o conceito de coisas acontecendo ao mesmo tempo E em tempos diferentes. Quem escuta a rua gritando gol enquanto a televisão ainda mostra a jogada sendo armada não percebe mas está… vivendo no passado.

Dá para conviver com o perceptivo, irritante mas aceitável atraso nas ligações telefônicas, mas uma conversa com 5 pessoas em continentes diferentes, usando meios de comunicação com tempo de transmissão diferentes logo se tornaria uma confusão só.

Claro, tecnicamente é possível resolver isso, da mesma forma que é feito com games: o servidor central gerencia o tempo de resposta de cada cliente e nivela por baixo. Na prática, NINGUÉM vai querer atrasar sua transmissão para se igualar a um mané qualquer usando 3 satélites pra ver um jogo no mesmo bairro. Portanto, lamento dizer, é um caso de spoiler que não tem jeito. A não ser você vede acusticamente sua sala. Obrigado de novo, Einstein.

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