IOF e o tiro no pé do crescimento industrial brasileiro

"Nossa alta carga tributária nos faz passar vergonha em termos de avanço tecnológico."

Bia Kunze
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• Atualizado há 1 semana

O post da semana passada, sobre os Saraivas do TI, repercutiu bastante. Escrevi uma continuação, explicando como agir quando os clientes é que são os Saraivas. Mas ficará para semana que vem, uma vez que um assunto bem mais urgente surgiu à tona nos últimos dias: a nova política do governo federal a respeito do IOF.

Para quem não acompanhou o recente noticiário econômico: a fim de conter a supervalorização do real e também de frear os gastos dos brasileiros no exterior, o governo aumentou a alíquota do IOF, o imposto sobre operações financeiras, de 2,38% para 6,38%.

O IOF é um tributo voltado àqueles que compram no exterior, e que chega pela fatura do cartão de crédito. Graças à recente bonança econômica e o dólar barato, os brasileiros estão viajando mais para fora e, consequentemente, gastando muito mais por lá também. Mesmo dentro de nossas fronteiras, estamos comprando mais produtos importados.

Não negamos que o progresso de um povo hoje está intimamente ligado aos meios digitais. Mais que modismo, PCs, laptops, tablets, celulares e smartphones significam informação, educação, qualificação profissional e avanço social e econômico.

O que o governo federal tem feito é um tapa na cara não só dos consumidores, mas daqueles que investem seu suor no crescimento industrial do país. Em vez de punirem o consumidor que busca qualidade, por que é não incentivam uma produção local de qualidade? A presidente Dilma e o ministro Paulo Bernardo, das Comunicações, já falaram que desejam tablets nacionais acessíveis a todos, custando R$ 600. Aumentar o IOF não fará as pessoas comprarem mais produtos nacionais automaticamente.

Com o IOF triplicado, caímos em situações contraditórias. Apesar de haver um App Store brasileira, compramos os softwares em dólar no cartão de crédito. Mesmo aplicativos feitos no país. A compra de versões digitais de revistas para iPad, como a Veja, acaba saindo mais cara que no papel. Adquirimos uma revista nacional como se fosse importada!

Conversei com alguns empresários da indústria brasileira, em especial os ligados ao setor tecnológico, e a pergunta que fiz a todos é: “Por que é que produto nacional ainda significa baixa qualidade?”

A resposta é que, quando se visa abastecer o mercado interno com opções mais em conta que as estrangeiras, o que importa para o consumidor final é sempre o preço. Ele tem que ser o mais baixo possível, ainda mais nessa época de competição acirrada com os chineses. Uma vez que não há como fugir dos impostos, o jeito é sacrificar a qualidade. Matéria-prima e fornecedores, só os mais baratos possíveis.

Presidente Dilma, you

Lembro-me com tristeza de um episódio ocorrido com um amigo no início do ano passado. Dono de uma confecção, ele já tinha contratado mais pessoas para dar conta das encomendas de camisetas e bonés para a Copa, quando um grande supermercadista cancelou o pedido por causa da contra-oferta de um chinês. Ele não tinha mais de onde baixar seu preço, senão quebrava. Ficou sem o cliente e reclamou: “Vamos todos torcer para a seleção brasileira com bandeirinhas chinesas!”

Sim, leitores, eu volto a bater nessa tecla! Nossa alta carga tributária é que nos faz passar vergonha em termos de avanço tecnológico, mesmo comparando-nos aos hermanos da América Latina. Sem desoneração fiscal e trabalhista, continuaremos mal na fita.

Alessandro Carlucci, o diretor-presidente da Natura, uma de nossas bem-sucedidas empresas tupiniquins, declarou recentemente que produzir no Brasil está muito caro. Para que continue bem-sucedida, sem abrir mão da qualidade dos produtos, a empresa tomou uma decisão polêmica: produzir fora do país em busca de melhores custos. Diz Carlucci: “O custo Brasil, que engloba câmbio e tributos, está muito alto. 40% da receita líquida da companhia no País vai para pagamento em tributos.”

E aí, presidente Dilma, qual será a próxima medida? A volta da reserva de mercado? Os leitores mais velhos devem se lembrar como era o nosso acesso à tecnologia antes dos anos 1990. Ninguém tem saudade dos tempos do tacape, exceto, talvez, alguns esquerdistas mais radicais e retrógrados. Já nos vejo tuitando na fogueira, com sinais de fumaça…

Obs.: Se já sentimos uma dor imensa com tal notícia, saber a real motivação do tributo chega a dar asco e revolta. Que mané contenção de gastos no exterior… Somos mesmo uns patos.

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Bia Kunze

Bia Kunze

Ex-colunista

Bia Kunze é consultora e palestrante em tecnologia móvel e novas mídias. Foi colunista no Tecnoblog entre 2009 e 2013, escrevendo sobre temas relacionados a sua área de conhecimento como smartphones e internet. Ela também criou o blog Garota Sem Fio e o podcast PodSemFio. O programa foi um dos vencedores do concurso The Best Of The Blogs, da empresa alemã Deutsche Welle, em 2006.

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